Band of Brothers


A abertura de O Resgate do Soldado Ryan garantiu um dos momentos mais impactantes do cinema nos últimos anos. Ao recriar o desembarque das tropas aliadas na Normandia em 6 de junho de 1944 – o Dia D da II Guerra Mundial –, Steven Spielberg elevou as cenas de combate a um patamar de realismo sem precedentes. Vista pelos olhos aterrorizados dos soldados, a batalha surge em toda a sua intensidade caótica e sangrenta. Mas Spielberg não se deu por satisfeito: associou-se ao protagonista da fita, o astro Tom Hanks, para conceber um desdobramento à altura de Soldado Ryan: Com orçamento de 120 milhões de dólares, trata-se da mais cara produção do gênero já feita para a TV. Os dez episódios do programa, que recentemente ganhou o Globo de Ouro, têm oito diretores, entre os quais Hanks, que responde pelo quinto capítulo (Spielberg se absteve de pôr a mão na massa). As batalhas de Band of Brothers nada ficam a dever à superprodução do cinema e sua fonte de inspiração também é a mesma, a obra do historiador americano Stephen Ambrose. Na verdade, graças ao seu formato, que totaliza mais de dez horas de duração, a série consegue ir além do filme como peça de reconstituição histórica, motivo pelo qual agradará especialmente aos iniciados no tema. Mais que transmitir a sensação de estar num combate moderno, ela expõe a rotina excruciante das baixas patentes, desde o treinamento até o inferno de viver por semanas dentro de uma trincheira, sob uma nevasca, observando a linha inimiga a algumas dezenas de metros. "O programa mostra bem o doloroso processo psicológico por que passaram os combatentes da II Guerra, do momento em que chegaram ao front até se tornarem veteranos", disse Ambrose a VEJA.



Cena de combate na Europa ocupada: do desembarque no Dia D ao Ninho da Águia de Hitler

Baseada no livro homônimo do historiador (veja quadro), Band of Brothers acompanha a trajetória verídica da Easy Company, um batalhão de pára-quedistas do Exército americano. O título – bando de irmãos, em inglês – vem de uma expressão extraída da peça Henrique V, de Shakespeare, que é dita pelo rei da Inglaterra ao exortar seus soldados combalidos a lutar com bravura. A metáfora se aplica bem às missões enfrentadas pela companhia. Depois de dois anos de treinamento nos Estados Unidos, eles partem para uma longa campanha contra os nazistas na Europa. Como vem à tona no segundo capítulo, a maneira como os pára-quedistas desbarataram uma bateria de canhões inimigos no Dia D, levando os alemães a atirar uns contra os outros, até hoje é tema de aulas nas academias militares. Depois de passar meses lutando na Holanda, na Bélgica e na França, o grupo encerra sua atuação com a tomada do Ninho da Águia, a fortificação nos Alpes alemães onde Hitler escondia tesouros artísticos pilhados por suas tropas. Por ter estado sempre na linha de frente, a Easy Company sofreu um alto índice de mortalidade. Só na invasão da Normandia, perdeu quase a metade de seus 139 homens.

Assim como em O Resgate do Soldado Ryan, nada no visual da série é fortuito. Onze cidades européias foram recriadas em estúdio e contou-se com 10.000 figurantes. Dos tanques às botas dos recrutas, todos os objetos são autênticos ou réplicas perfeitas. As referências das cenas de combate são as mais fidedignas: as fotografias do conflito feitas por Robert Capa, um dos fundadores da célebre agência Magnum, e as filmagens documentais realizadas pelo cineasta George Stevens (do clássico Assim Caminha a Humanidade). Essas imagens, captadas em super-8, estão entre os raros registros coloridos da II Guerra. A fotografia da série procura evocar sua textura, o que explica o tom acinzentado. Quanto ao elenco, não há grandes astros em cena – mas eles não fazem a mínima falta. O personagem de maior destaque, o major Richard Winters, é vivido pelo desconhecido porém competente ator inglês Damian Lewis. A presença mais notória é a de David Schwimmer, da série Friends. Ele está surpreendentemente bem no papel de um oficial durão que se revela covarde e inepto para o comando. Falar em personagens principais seria um exagero, já que os dramas humanos são pulverizados por todo o batalhão da Easy Company. A maioria deles corresponde a combatentes reais, vários dos quais ainda estão vivos. Os depoimentos dos sobreviventes no início de cada episódio provam que, mais que uma opção, a camaradagem é uma arma vital quando se está sob o fogo pesado da artilharia.